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Análise Geográfica

As operações de consulta e manipulação de dados geográficos constituem a essência de um SIG, ao diferenciar o Geoprocessamento de tecnologias como Cartografia Automatizada e Projeto Auxiliado por Computador. O que distingue um SIG de outros tipos de sistemas de informação são aquelas funções que possibilitam a realização de análises espaciais (geográficas). Tais funções utilizam os atributos espaciais e não espaciais das entidades gráficas armazenadas na base de dados espaciais; buscando fazer simulações (modelos) sobre os fenômenos do mundo real, seus aspectos ou parâmetros.

O aspecto mais fundamental dos dados tratados em um SIG é a natureza dual da informação: um dado geográfico possui uma localização geográfica (expressa como coordenadas em um mapa) e atributos descritivos (que podem ser representados num banco de dados convencional). Outro aspecto muito importante é que os dados geográficos não existem sozinhos no espaço: tão importante quanto localizá-los é descobrir e representar as relações entre os diversos dados. Alguns exemplos dos processos de análise espacial típicos de um SIG estão apresentados na tabela abaixo.

EXEMPLOS DE ANÁLISE ESPACIAL


Análise
Pergunta Geral
Exemplo
Condição
O que está...?
Qual a população desta cidade ?
Localização
Onde está...?
Quais as áreas com declividade acima de 20%?
Tendência
O que mudou...?
Esta terra era produtiva há 5 anos atrás ?
Roteamento
Por onde ir.. ?
Qual o melhor caminho para o metrô ?
Padrões
Qual o padrão...?
Qual a distribuição da dengue em Fortaleza?
Modelos
O que acontece se...?
Qual o impacto no clima se desmatarmos a Amazônia ?


Um exemplo concreto sobre análise espacial realizado em 1854 na cidade de Londres, onde a população estava sofrendo uma grave epidemia de cólera, doença sobre a qual na época não se conhecia a forma de contaminação. Numa situação aonde já haviam ocorrido mais de 500 mortes, o Dr. John Snow teve um "estalo": colocar no mapa da cidade a localização dos doentes de cólera e os poços de água (naquele tempo, a fonte principal de água dos habitantes da cidade). O mapa obtido está mostrado na figura abaixo.



Figura - Mapa de Londres com casos de cólera (pontos) e poços de água (cruzes) (adaptado de E. Tufte, 1983).

Com a espacialização dos dados, o Dr. Snow percebeu que a maioria dos casos estava concentrada em torno do poço da "Broad Street" e ordenou a sua lacração, o que contribuiu em muito para debelar a epidemia. Este caso forneceu evidência empírica para a hipótese (depois comprovada) de que o cólera é transmitido por ingestão de água contaminada. Esta é uma situação típica aonde a relação espacial entre os dados muito dificilmente seria inferida pela simples listagem dos casos de cólera e dos poços. O mapa do Dr. Snow passou para a História como um dos primeiros exemplos que ilustra bem o poder explicativo da análise espacial.

Numa visão geral, pode-se dividir as operações de análise espacial em três grandes grupos:
  • Manipulação de geo-campos: também chamadas de álgebra de mapas, operam sobre mapas temáticos, imagens e modelos numéricos de terreno. Como exemplo, podemos citar as operações booleanas sobre mapas temáticos.
  • Consulta a geo-objetos: estas operações permitem a recuperação de geo-objetos que satisfazem as restrições (espaciais ou convencionais). Como exemplo, tome-se a consulta "recupere todos os terrenos vizinhos da casa da Dinda" ou "indique todas as cidades da Bahia com mais de 50.000 habitantes".
  • Conversão entre geo-campos e geo-objetos: esta classe de operações realiza a transformação entre geo-campos e geo-objetos. A geração de um mapa de distâncias a partir de um ou mais geo-objetos para produzir um modelo de terreno com os valores das distâncias aos pontos selecionados é um exemplo.
Geoprocessamento e Suporte à Decisão

Introdução

Um dos aspectos mais importantes do uso das geotecnologias é o potencial dos SIGs em produzir novas informações a partir de um banco de dados geográficos. Tal capacidade é fundamental para aplicações como ordenamento territorial e estudos de impacto ambiental, caso em que a informação final deve ser deduzida e compilada a partir de levantamentos básicos. Também é muito relevante em estudos sócio-econômicos, quando desejamos estabelecer indicadores que permitam uma visão quantitativa da informação espacial.

Qual o grande desafio da produção de novas informações em um SIG ? A capacidade de comparar e avaliar as diferentes possibilidades de geração de novos mapas. Como o SIG oferece uma grande quantidade de funções de Álgebra de Mapas, nem sempre é facil escolher qual a forma de combinação de dados mais adequada para nossos propósitos.

Neste contexto, é muito útil dispor de ferramentas de suporte à decisão, que nos ajudam a organizar e estabelecer um modelo racional de combinação de dados. O SPRING dispõe de uma ferramenta de apoio à tomada de decisões em Geoprocessamento, baseada na técnica AHP ("Processo Analítico Hierárquico").

Suporte à Decisão - Conceitos Básicos

Decidir é escolher entre alternativas. Com base nesta visão, podemos encarar o processo de manipulação de dados num sistema de informação geográfica como uma forma de produzir diferentes hipóteses sobre o tema de estudo.

O conceito fundamental dos vários modelos de tomada de decisão é o de racionalidade. De acordo com este princípio, indivíduos e organizações seguem um comportamento de escolha entre alternativas, baseado em critérios objetivos de julgamento, cujo fundamento será satisfazer um nível pre-estabelecido de aspirações.

O modelo racional de tomada de decisão preconiza quatro passos que devem ser seguidos para uma escolha apropriada:
  • Definição do problema: formular o problema como uma necessidade de chegar a um novo estado.
  • Busca de alternativas: estabelecer as diferentes alternativas (aqui consideradas como as diferentes possíveis soluções do problema) e determinar um critério de avaliação.
  • Avaliação de alternativas: cada alternativa de resposta é avaliada.
  • Seleção de alternativas: as possíveis soluções são ordenadas, selecionando-se a mais desejável ou agurpando-se as melhores para uma avaliação posterior.
A Técnica AHP - Processo Analítico Hierárquico

Quando temos diferentes fatores que contribuem para a nossa decisão, como fazer para determinar a contribuição relativa de cada um ? Para abordar este problema, Thomas Saaty propõs, em 1978, uma técnica de escolha baseada na lógica da comparação pareada. Neste procedimento, os diferentes fatores que influenciam a tomada de decisão são comparados dois-a-dois, e um critério de importância relativa é atribuído ao relacionamento entre estes fatores, conforme uma escala pré-definida (veja tabela).
Escala de Valores AHP para Comparação Pareada

Intensidade de importância
Definição e Explicação
1 Importância igual - os dois fatores  contribuem igualmente para o objetivo
3 Importância moderada - um fator é ligeiramente mais importante que o outro
5 Importância essencial - um fator é claramente mais importante que o outro
7  Importância demonstrada - Um fator é fortemente favorecido e sua maior relevância foi demonstrada na prática
9 Importância extrema - A evidência que diferencia os fatores é da maior ordem possível.
2,4,6,8 Valores intermediários entre julgamentos - possibilidade de compromissos adicionais


A partir do estabelecimento de critérios de comparação para cada combinação de fatores, é possivel determinar um conjunto ótimo de pesos que podem ser utilizados para a combinação dos diferentes mapas.

Suporte à Decisão em Geoprocessamento

Consideramos uma das situações mais comuns em SIG: classificar o espaço em áreas mais ou menos adequadas para uma finalidade. Este problema ocorre em grande número de aplicações, como zoneamento, prospecção mineral, e seleção de áreas para um novo empreendimento comercial.

Tome-se, por exemplo, um estudo de preservação ambiental em áreas de encosta, para estabelecer uma política de ocupação, associada a mapas de risco de desmoronamento e impacto ambiental. Para tanto, vamos supor que dispomos de um mapa topográfico, da carta geotécnica, e de um mapa de uso e ocupação do solo (obtido a partir de foto- interpretação ou classificação digital de imagens de satélite).

O procedimento tradicional de análise baseia-se no princípio de “interseção de conjuntos espaciais de mesma ordem de grandeza” (Yves Lacoste) e está baseada em condicionantes (“risco máximo ocorre em áreas cuja declividade é maior que 10%, não são áreas de preservação ambiental, e o tipo de terreno é inadequado”). A transposição deste metodologia analógica para o ambiente de SIG requer o uso de operações booleanas (OU, E, NÃO) para expressar as diferentes condições. Esta técnica utiliza o computador como mera ferramenta automatizada de desenho, ignorando todo o potencial de processamento numérico do SIG, e gera descontinuidades inexistentes no dado original. Por exemplo, áreas com declividade igual a 9,9% serão classificadas diferentemente de regiões com inclinação de 10,1%, não importando as demais condições.

Mapas são dados e não desenhos. Tratar mapas como dados significa dar forma numérica ao espaço ao associar, a cada localização, um valor que representa a grandeza em estudo; requer ainda, na maior parte dos casos, o uso do formato matricial (“raster”), mais adequado a uma representação contínua do espaço.

No caso em apreço, a análise espacial em SIG será muito melhor realizada com uso da técnica de classificação contínua: os dados são transformados para o espaço de referência [0..1] e processados por combinação numérica, através de média ponderada ou inferência “fuzzy”. Ao invés de um mapa temático com limites rígidos gerados pelas operações booleanas, obteremos uma superfície de decisão, sob forma de uma grade numérica. O que representa este resultado ? Uma visão contínua da variação da nova grandeza (seja ela adequação a plantio, indicador de mineralizações ou susceptibilidade ambiental).

No exemplo citado, o resultado será uma grade numérica que indica, para cada localização, o risco de desmoronamento, numa gradação de 0% a 100%. Qual a grande vantagem desta situação? Ela nos permite construir cenários (por exemplo, risco de 10%, 20% ou 40%), que indicam os diferentes compromissos de tomada de decisão (maior ênfase em proteção ambiental ou em minimizar o custo econômico). Obtemos assim uma flexibilidade e um entendimento muito maiores sobre os problemas espaciais.


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